"O pai morreu.
A sala de televisão está ceia, há gente sentada no cão, nas cadeiras, de pé junto à porta, encostada à parede, encavalitada no parapeito da janela, tanta gente que a sala ainda fica mais pequena e mais escura. O candeeiro dos cristais apagado, só os candeeiros foscos da parede e a luz que vem da televisão a aclarar os que estão mais próximos [...] É hoje. Hoje é o dia da independência de Angola. Angola acabou, nossa Angola acabou. Não sei para que estou a olha para a televisão, não sei por que estou aqui.
[...]
Não consigo viver sempre à espera que o pai chegue. Ninguém consegue viver sempre à espera de uma coisa assim. Sejas tu quem fores, tens de existir para que eu não espere mais. Sejas tu quem fores, existes e eu não espero mais. Sejas tu quem fores escolheste matar-me o pai.
O pai morreu."
Dulce Maria Cardoso in O Retorno
domingo, 31 de maio de 2015
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